“Temos que cimentar a ideia de que a acessibilidade não é para nichos”

Filipe Azevedo, dirigente da Acapo (Associação dos cegos e amblíopes de Portugal) considera que António Costa deu um grande passo ao escolher para o seu Governo uma secretária de estado cega, mas refere que o caminho ainda é longo até ao cumprimento integral dos direitos da pessoa com deficiência.
Na noite desta terça-feira, entrevistado pela RUM, Filipe Azevedo, também ele cego, afirmou que desde que Ana Sofia Antunes chegou ao Governo, muito mais foi feito em prol dos deficientes. Considerando que as vantagens “são óbvias” e que foi “um grande passo”, o dirigente refere que “muitas das coisas que estão a ser feitas em prol da deficiência já vinham a ser trabalhadas e reflectidas na Acapo, o que só prova que o lobby da deficiência ainda não é suficientemente forte”. “Basta perceber a baixíssima representatividade de pessoas com deficiência em cargos políticos”, assinala.
Ainda que considere que o nosso país não é dos mais atrasados nas preocupações e respostas aos cidadãos deficientes, Filipe Azevedo alerta para muitos problemas que persistem, nomeadamente no que respeita às repartições públicas que “têm que estar muito melhor preparadas para atender uma pessoa cega ou de baixa visão”. Diz que “é preciso mais formação”. Já as empresas prestadoras de serviço “têm que começar a olhar para as pessoas com deficiência como clientes de pleno direito”.
Na opinião de Filipe Azevedo continuam a existir conflitos de interesse, nomeadamente nos dissuasores de estacionamento. “Por mais cuidado que tenhamos com o material a colocar, eles prejudicam sempre a mobilidade dos peões, e o mais curioso é que quem tem de pagar pela falta de civismo de alguns automobilistas são os peões, o que é caricato”, critica.
Investimento não pode ser pensado se vai ou não servir muitas pessoas
No que respeita à cidade de Braga, Filipe Azevedo considera que tem melhorado, dando como exemplo a preocupação com as zonas trinta e “a colocação de piso táctil nas passadeiras” ou o facto de o município consultar a ACAPO com frequência no sentido de perceber se uma intervenção na via pública está de acordo com o que é defendido.
O dirigente da Acapo lembra que o investimento não pode ser pensado se vai ou não servir muitas pessoas. “Temos que cimentar a ideia de que a acessibilidade não é para nichos. Antigamente o investimento que se fazia na acessibilidade era muito na perspectiva de ‘se calhar não compensa’ porque não vai passar aqui com cadeira de rodas ou cega com bengala. Temos que perceber que um passeio acessível vai beneficiar toda a gente em geral, e a começar desde logo pelos mais velhos e faz-me muita confusão como é que não pensamos nisso, porque todos nós queremos viver o mais tempo possível e com qualidade de vida”, argumenta.
Cego de nascença, Filipe Azevedo sublinha ainda a ideia de que “ninguém está a fazer um favor”, porque são direitos presentes na Constituição.
