10% dos docentes da Faculdade de Direito da UL denunciados por assédio e discriminação 

Mais de três de dezenas de professores da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, cerca de 10 por cento do total, foram denunciados por assédio moral e sexual. O Diário de Notícias (DN) conta, esta segunda-feira, que foram apanhados nas denúncias registadas nos primeiros dias de uma linha criada para receber queixas.

O jornal escreve que, na grande maioria, os casos foram presenciais. No entanto, houve também situações através das redes sociais e e-mail.

O documento refere comentários ou piadas sobre a condição sexual, telefonemas e mensagens inapropriadas, contacto físico intencional e não solicitado e também pedidos de favores sexuais, em troca da promessa de vantagens académicas e profissionais.

De acordo com o relatório desta experiência, ao qual o DN teve acesso, e que conclui pela existência de “problemas sérios e reiterados de assédio sexual e moral perpetrados por docentes da Faculdade”, houve 70 denúncias, 50 das quais foram validadas como relevantes. Dizem respeito a 31 docentes, ou seja, cerca de 10% do total de professores e assistentes da escola. Sete deles concentram mais de metade (30) das denúncias, havendo um com nove e dois com cinco; 19 dos testemunhos referem “práticas reiteradas”.

As situações relatadas ocorreram, na sua maioria, presencialmente, mas também através das redes sociais e por email. A vasta maioria dos relatos respeitante a ações presenciais, informa-se, “refere-se a atividades em aula ou na sequência da aula, embora também haja casos relativos a provas orais (cinco) e um relativo a uma prova escrita.”

O documento, elaborado por uma comissão paritária de três docentes e três alunos criada por iniciativa do Conselho Pedagógico, comissão essa que decidiu abrir o referido “canal” para denúncias, não descreve qualquer situação concreta (os relatos foram anonimizados para a análise; apenas uma pessoa da comissão sabe a quem se referem) mas elenca o que foi considerado assédio sexual.

“Repetir sistematicamente observações sugestivas, piadas ou comentários sobre a aparência ou condição sexual; realizar telefonemas, enviar cartas, mensagens ou e-mails indesejados, com texto ou imagens, de caráter sexual, de forma expressa ou insinuada; promover o contacto físico intencional e não solicitado, ou excessivo, ou provocar abordagens físicas desnecessárias; enviar convites persistentes para participação em programas sociais ou lúdicos, quando a pessoa visada demonstrou que o convite é indesejado”, exemplifica-se. E acrescenta-se: “Apresentar convites e pedidos de favores sexuais associados a promessa de obtenção de vantagens académicas ou profissionais, podendo esta relação ser expressa e direta ou insinuada)”.

De acordo com o que o DN conseguiu saber, há nas denúncias referência a um professor da FDUL que praticará tal “lógica transacional”.

Quanto ao assédio moral, é assim exemplificado: “Pela sua gravidade ou repetição, tentativas de intimidações ou represálias, atos provocatórios e humilhantes, comportamentos acintosos que demonstrem falta do respeito ou consideração devidos), que representam uma quebra na confiança própria da relação pedagógica e impedem a criação de um ambiente propício à aprendizagem.”

Em metade dos relatos, as práticas descritas terão tido como destinatário uma pessoa ou, em caso de comportamento reincidente, várias separadamente; noutra metade, ter-se-ão dirigido aos alunos em geral, ou a “categorias” de alunos.

Os alvos de xenofobia/racismo terão sido alunos brasileiros, negros ou originários de países africanos de língua oficial portuguesa; no caso do sexismo, todos os casos se referem a discriminação de pessoas do género feminino. Não é identificado o alvo do único caso de homofobia referido.

Catarina Preto, presidente da Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, faz parte da comissão paritária que analisou os relatos. E assume ao DN não ter ficado surpreendida.

“Veio ao encontro do que já sabia – aliás mesmo se não tive acesso ao nome dos professores consegui identificar alguns por conhecimento de casos – embora algumas peripécias específicas me tenham chocado. De acordo com as conversas que tenho com outras associações, isto acontece em todas as faculdades, numas mais e noutras menos”, diz. “Há que haver um basta nestas situações, que são gravíssimas numa instituição de ensino. Ninguém quer este tipo de ambiente. Os alunos têm de perceber que se está a fazer alguma coisa, temos de tentar restaurar a confiança na faculdade. É preciso avançar agora para o manual de boas práticas e para o código de conduta.”

Foi precisamente de Catarina que partiu, em reunião de 12 de janeiro do Conselho Pedagógico (cuja ata, como sucede com todas, é pública), o alerta para o problema do assédio na escola. Mencionando o caso de um professor em relação ao qual foram apresentadas várias queixas, sem que houvesse consequências, assegurou existir, da parte dos alunos, um medo de represálias que leva a que não denunciem as situações.

Foi coadjuvada por um dos professores, Miguel Prata Roque, que considerou não ser a FDUL”um free space” (querendo dizer que não é um espaço seguro), afirmando mesmo que impera na escola “um clima de terror” algo muito diferente, opina, do que “deve ser um culto de exigência”.

Outro professor, João Miranda, mencionou a “relação especial de poder” que existe entre professores e alunos, apelando a que a faculdade seja “proativa na investigação destas situações”, já que, reconhece, “muitas vezes estas não são relatadas pelos alunos por inexistir um quadro de liberdade para o fazer e por a comunidade estudantil não ter a expectativa de que possam vir a ter procedência”. Concluiu confessando-se embaraçado por se saber “na mesma instituição que pessoas que praticam este tipo de atos que considera degradantes.”

Estas afirmações foram feitas perante o aparente espanto do presidente do conselho pedagógico, António Barreto Menezes Cordeiro, o qual disse não ter conhecimento de nos vários mandatos anteriores do órgão terem sido apresentados casos de assédio, pelo menos com “contornos desta gravidade”.

c/DN

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