Pandemias podem ser frequentes? Sintomas graves são sinónimo de mais imunidade?

Esta terça-feira, 2 de Março, Portugal assinalou um ano desde que foram registados os primeiros casos de infeção pelo vírus SARS-COV-2.

Esta noite, no UMinho I&D, conversamos com o investigador do Instituto de Ciências da Vida e da Saúde (ICVS) da Escola de Medicina da Universidade do Minho, internista e responsável pela unidade de doenças infeciosas no Hospital de Braga, Alexandre Carvalho, com o intuito de ver algumas das dúvidas, mais recorrentes sobre a covid-19, respondidas.

Casos de reinfeção, imunidade, máscaras, eficácia e segurança das vacinas, são alguns dos temas abordados.

Depois de mais de 804 mil infetados em Portugal pela covid-19. Já é possível dizer se uma pessoa que já contraiu o vírus pode, meses depois, voltar a ser infetada?

Segundo o responsável pela unidade de doenças infeciosas no Hospital de Braga, ainda não é possível afirmar com certezas quanto tempo dura a imunidade após infeção natural. “O que sabemos é que as reinfeções de um vírus que continua a circular com bastante força, apesar das medidas de confinamento, seriam mais frequentes se esse fenómeno pós-infeção não ocorresse, mas essa imunidade não é perfeita”.

Exemplo disso são alguns utentes que passam pela unidade de saúde bracarense que 10 meses depois continuam com anticorpos já outros apenas 3 ou 4 meses passados já perderam essa proteção. 

A intensidade dos sintomas pode ter alguma relação com a imunidade, ou seja, pessoas com mais sintomas têm imunidade por um período alargado?

“É atrativo, mas não é verdade nesta patologia. Não há uma relação linear entre uma pessoa com sintomas graves de covid-19 ter muita imunidade ou assintomáticas ter poucos anticorpos. Há pessoas que ficaram pouco doentes ou estavam mesmo assintomáticas e têm uma quantidade apreciável de anticorpos”.



Continuar com tosse depois de 14 dias de isolamento é indicativo que pode infetar terceiros ou, apesar dos sintomas persistirem, já não existe perigo?

“Há uma primeira fase quando o novo coronavírus entra em contacto com a pessoa em que ele se replica rápida e intensamente. Sintomas como a tosse servem para expelir e causar infeção em terceiros. Essa fase dura cerca de 7 a 8 dias. Estudos demonstram que a partir do 9º dia, a pessoa já não é infeciosa, ou seja, não transmite a doença. Contudo, não está curada”.

Alexandre Carvalho explica que o SARS-COV-2, ao contrário do vírus da gripe, consegue infetar órgãos e células de forma mais ampla. Para além do sistema respiratório o vírus ataca o sistema nervoso central, o que explica a perda de olfato. 

Como internista que sequelas lhe têm passado pelas mãos no Hospital de Braga?


Aos microfones do UMinho I&D, o convidado adianta que alguns doentes meses depois da infeção estar ultrapassada continuam a apresentar sequelas respiratórias. Algo considerado “normal”, visto que o novo coronavírus acaba por “destruir tecido pulmonar”. No entanto, persiste a dúvida sobre se essas sequelas serão definitivas, em alguns casos.

O internista revela que em doentes mais jovens que apresentaram sintomas leves, têm surgido sequelas no sistema nervoso central, o que resulta em “desconcentração e amnesia”.

O Hospital de Braga já acompanhou 1.748 doentes com covid-19, número referentes a 1 de Março, sendo que mais de 300 continuam a ser acompanhadas através de consultas de avaliação pós-infeção.

Há algumas semanas atrás, houve um grande debate em torno das máscaras comunitárias. Uma salvação no início da pandemia, principalmente para as empresas do setor têxtil, mas em Fevereiro começaram a ser colocadas em causa. Quais as melhores opções: comunitárias, cirúrgicas ou as FFP2? Devemos utilizar duas máscaras ou pode ser mais prejudicial que benéfico?


“As máscaras comunitárias que estão certificadas pelo CITEVE, em Portugal, são boas opções pois oferecem níveis de proteção muito aceitáveis que podem chegar aos 95%. A chave está na sua composição e adaptação à face.

As cirúrgicas são boas principalmente para as pessoas doentes, uma vez que contêm o vírus, mas têm um problema que é a adaptação à cara em alguns casos.

As FFP2 são respiradores de partículas. Além de uma capacidade de filtração melhor não tem fugas, mas são mais cansativas”.

Quando à utilização de duas máscaras em simultâneo, “não vejo grande vantagem”, frisa o convidado do UMinho I&D. “Duas máscaras implica maior manipulação e dificuldade em respirar”, acrescenta.

Neste momento, mais de 2% dos portugueses já receberam as duas doses da vacina contra a covid-19, mas continuam a existir receios em relação às vacinas. Portugal está a administrar vacinas da Pfizer/Biontech que tem uma eficácia de 95%, da Astrazeneca cerca de 90% e da Moderna 94%. Já a Johnson and Johnson avança com 85%. Estes números são satisfatórios, por exemplo, quando comparados com vacinas como da gripe?


“A taxa de eficácia da vacina da gripe anda por volta dos 50-60% e ninguém discute a sua utilidade. Queria lembrar que a taxa de 95% não reduz a infeção. Trata-se da redução da probabilidade de infeção grave”, sustenta. Neste momento, o especialista em doenças infeciosas considera prematuro o relaxamento das medidas de contenção do vírus, uma vez que para tal será necessário que grande parte da população esteja inoculada, pois a questão da transmissão continua a ser uma realidade.

O Governo já anunciou que irá apresentar o plano de desconfinamento a 11 de Março. Ao que tudo indica, as escolas serão as primeiras a abrir portas. Concorda com esta opção ou pode ser um erro?


“Devíamos de nos comprometer com objetivos quantificáveis: número de casos, internados, transmissões no âmbito de determinadas regiões etc. Sabendo que as crianças, apesar de tudo, são de pouco risco em termos de doença grave, mas não deixam de ser portadoras e transmissoras do vírus, as escolas parecem ser uma opção viável para que haja o mínimo de normalidade. A ausência de sociabilidade deve ser muito perturbadora para os nossos jovens”.

Alexandre Carvalho avança aos microfones do UMinho I&D que o paciente mais novo que esteve internados nos cuidados intensivos do Hospital de Braga tinha 23 anos. 

Considera que pode ser cada vez mais recorrente o aparecimento de vírus semelhantes ao SARS-COV-2, ou seja, com a mesma gravidade? Pode estar relacionado com a invasão de habitats?


“Esse receio é bem fundamentado. Esta já é a segunda pandemia do século. O facto de sermos cada vez mais, de invadirmos territórios onde há animais que albergam espécies de vírus que não conhecemos e podem saltar de outros mamíferos para nós, isto naturalmente pode acontecer mais vezes. Devemos aproveitar estes meses para aprender alguma coisa. Prevenir e sobretudo reagir mais atempadamente, nomeadamente, através da produção de vacinas. Adaptar esta tecnologia a outros agentes patogénicos para fazer face a uma eventual ameaça que venha a surgir”. 

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Vanessa Batista
Vanessa Batista

Jornalista na RUM

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