Portugueses são os que mais gastam em alimentação da UE. Preços dispararam 34% desde a pandemia

Os portugueses são dos que mais gastam em comida e bebida na União Europeia (UE). Foram os terceiros que mais despenderam nos 27, em média, em alimentação, em 2024, num total de €3314 por pessoa, e por ano, em termos nominais, ou seja, o dinheiro efetivamente gasto, sem descontar a inflação, segundo dados do Eurostat.

Já em paridades de poder de compra, corrigindo o nível de preços — ou seja, como se os países da UE tivessem todos o mesmo nível de custo de vida —, Portugal foi mesmo o país da UE que, em média, mais despendeu em alimentação, com uma despesa real (isto é, ajustada à inflação) per capita de €3300 por ano — uma subida de 43,5% face aos níveis de 2020. Trocando por miúdos: os portugueses gastaram mais em alimentos e bebidas não alcoólicas desde a pandemia, e compraram mais em comparação com os consumidores dos outros Estados-membros. Este número, e o facto de ser tão elevado, espelha não só o aumento do nível de preços, mas também uma maior propensão a comprar alimentos pelos portugueses desde o início da pandemia, independentemente dos níveis (em média baixos) de rendimentos de quem cá vive.

E tudo apesar de uma inflação particularmente pronunciada nos bens alimentares. Em Portugal, os preços da alimentação aumentaram 33,5%, entre fevereiro de 2020 (o último mês sem os efeitos da pandemia da covid-19) e junho de 2025. Ou seja, acima da inflação total no mesmo período, que se cifrou nos 21,5%, de acordo com os cálculos do Expresso com base nos mais recentes dados do Instituto Nacional de Estatística (INE).

De todos os bens e serviços analisados pelo INE, a taxa de inflação na rubrica de produtos alimentares e bebidas não alcoólicas — a componente que mais absorve o rendimento disponível das famílias — foi só superada pela subida de 42,3% nos preços da categoria de restaurantes e hotéis, com um peso muito menor na despesa total das famílias.

Um euro compra hoje menos produtos em Portugal do que em países como Espanha ou Países Baixos.

Nas subcategorias de consumo do INE, vemos que a rubrica de frutas (43,1%), de açúcar, confeitaria, mel e outros produtos à base de açúcar (39,6%), e a carne (38,4%), foram as que maiores taxas de inflação apresentaram face ao pré-pandemia. O pão e cereais — que, com a carne, são as subcategorias que mais contam dentro da rubrica de alimentação — encareceram, em média, 33,5%.

Os aumentos de preços nestas duas categorias face ao período pré-pandemia têm um impacto particularmente significativo em Portugal se alargarmos a análise para o conjunto da União Europeia (UE). O país está no fundo da tabela da lista de países da UE com menor rendimento disponível bruto per capita (€14,3 mil em Portugal em 2024, face a €18,1 mil na média dos 27).

O rombo é mais notório quando se compara os níveis de preços na alimentação de 2019 com os de 2024 na UE, medidos em paridades de poder de compra. No último ano livre do impacto da pandemia da covid-19, os preços da categoria de alimentação e bebidas não alcoólicas estavam, em Portugal, abaixo da média europeia, nos 97,4%.

Com a pandemia e a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 2022, a situação inverteu-se em Portugal: em 2024, já eram necessários, em média, €101,5 para comprar os mesmos produtos que, na média da UE, custariam €100. Isto é, os portugueses perderam efetivamente poder de compra, com os produtos a ficarem mais caros em território nacional, em termos relativos, face à média dos 27. O que contrasta com Espanha e nos Países Baixos, com níveis de preços mais vantajosos do que o português em 2024, nos 98,9% e 95,2%.

Nenhum país da UE escapou à inflação alimentar nestes últimos anos. Espanha e Alemanha viram os preços da alimentação subir mais de 36% de fevereiro de 2020 a maio de 2025. Mas os dois paí¬ses têm níveis de rendimentos superiores ao dos portugueses e com menos despesa, em termos proporcionais, em comida e bebida.

Luís Mira, secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), justifica o aumento dos preços na alimentação com a subida dos custos do trabalho: “Se tivermos por referência o aumento do salário mínimo nacional entre 2020 e 2025, que foi de 37%, percebe-se que um dos custos de produção que mais tem impactado a evolução dos preços é, necessariamente, o da mão de obra”.

“A este acrescente-se, no caso específico do setor agrícola, a trajetória de subida de outros fatores de produção, nomeadamente da energia, como eletricidade e combustíveis, assim como dos fertilizantes e adubos, altamente afetados pela disrupção das cadeias de abastecimento provocada, em parte, pela invasão da Ucrânia pela Rússia”, disse.

Alegando que há “uma parte muito relevante” dos custos que “está a ser absorvida pelos próprios produtores”, Luís Mira defende que “os agricultores têm sistematicamente sacrificado a sua margem para não transferirem o aumento total dos custos de produção para os consumidores. E não têm, para isso, sido ressarcidos na devida medida.”

O Expresso enviou questões à Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), a representante das retalhistas nacionais, sobre como estas empresas geriram o surto inflacionista dos últimos anos no mercado português, mas não foi possível obter resposta em tempo útil.

Jornal Expresso

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