Salário dos trabalhadores com ensino superior caiu 134 euros entre 2006 e 2020

O salário real dos trabalhadores com ensino superior diminuiu 134 euros entre 2006 e 2020, devido às várias crises económicas que Portugal atravessou neste período e à entrada no mercado de trabalho de um elevado número de jovens diplomados. Em 2006, o salário real médio dos trabalhadores com ensino superior era de 1745 euros e, passada uma década e meia, caiu 7,7% para 1611 euros.
Segundo o jornal Público, esta é uma das conclusões do estudo sobre A Distribuição dos Salários em Portugal no Período 2006-2020, da autoria dos economistas Sónia Félix, Fernando Martins, Domingos Seward e Marta Silva, divulgado pelo Banco de Portugal (BdP) ontem. O trabalho teve por base a informação contida nos Quadros de Pessoal dos anos analisados — marcados por uma inflação reduzida, por várias crises e pela entrada de um grande volume de diplomados no mercado de trabalho — e centrou-se nas empresas do sector privado e do sector empresarial do Estado (exceto agricultura e pesca) do continente. Os economistas começam por sublinhar que a maior oferta de mão-de-obra com ensino superior tem sido acompanhada de um “diferencial salarial positivo” para os trabalhadores com este nível de ensino. E embora o prémio salarial seja menor do que no início do período analisado, ele “permanece elevado”.
Em 2020, notam, o salário médio real de um trabalhador com licenciatura era superior em 52% ao de um trabalhador com ensino secundário, valor que compara com os 60% de 2006. O estudo mostra ainda que o momento e as condições de entrada no mercado de trabalho determinam o perfil salarial dos trabalhadores ao longo da sua vida ativa, reiterando as conclusões de outros estudos que se têm dedicado a avaliar os efeitos das principais crises económicas na evolução das remunerações. Os autores começaram por analisar a evolução dos salários dos trabalhadores com ensino superior, de idade igual ou inferior a 30 anos, que aparecem na base de dados pela primeira vez no período entre 2006 e 2020. E uma das conclusões a que chegaram foi que, entre 2010 e 2014 —anos que incluem a permanência da troika em Portugal —, se assistiu a uma redução do salário médio real no início da carreira. Nos anos seguintes, houve uma recuperação acentuada das remunerações, mas, em 2020, o salário médio real dos que chegaram ao mercado de trabalho ainda era inferior ao observado no período entre 2006 e 2010. O salário de entrada de um licenciado era, em 2006, de 1088 euros, valor que baixou para 951 euros em 2011 — ano que marca a entrada da troika em Portugal. Nos anos seguintes, este valor continuou a baixar, tendo começado a recuperar de 2015 em diante. Ainda assim, em 2020, a remuneração de um jovem com licenciatura ou bacharelato acabado de chegar ao mercado de trabalho era de 1050 euros.
Trata-se de uma recuperação face a 2011, é certo, mas continua 3,5% abaixo do valor pago a quem começou a trabalhar em 2006. Já no caso dos trabalhadores que entram para o mercado de trabalho com um mestrado feito, o salário médio real aumentou 2,4%, passando de 1150 euros, no início do período analisado, para 1178 euros em 2020. Apesar de ainda não se terem recuperado as perdas salariais do período da troika, os economistas do BdP consideram que o facto de se assistir a uma recuperação dos salários de entrada dos diplomados nos anos mais recentes é sinal de que está a haver “um ajustamento gradual da procura de trabalho ao aumento signiÆcativo da oferta de trabalhadores com escolaridade mais elevada”.
Mudar com prémio de 9%
Para perceber melhor a forma como os salários evoluíram desde o momento da entrada no mercado de trabalho, os economistas do BdP agruparam os trabalhadores em três escalões etários (25 a 34 anos, 35 a 44 anos e 45 a 54 anos) em função da idade que tinham em 2006, acompanhando os que permaneceram na base de dados durante todo o período analisado. E concluem que, em 2020, o salário médio real dos indivíduos com idade entre os 25 e os 34 anos (2073 euros) era ainda inferior ao salário médio real em 2006 dos trabalhadores do escalão etário imediatamente acima (2102 euros). Isto, referem, “ilustra a importância do salário de entrada na definição do salário ao longo da vida ativa”. Este fatalismo pode ser alterado por diversos fatores e um deles é a mudança de emprego. Os dados permitem concluir que os trabalhadores que mudaram de empresa tiveram, no ano da mudança, um crescimento salarial médio de 5%, acima do crescimento salarial médio de 2% observado para os que permaneceram na mesma empresa. A diferença tende a ser mais significativa para os trabalhadores com ensino superior, que tiveram, em média, um aumento salarial de 9% no ano da mudança.
Salário médio cresceu 1%
Em termos globais, o estudo do BdP revela que o salário médio real no sector privado registou um crescimento anual médio de 1% entre 2006 e 2020. Este crescimento variou consoante os grupos populacionais e foi fortemente influenciado pelos aumentos do salário mínimo nacional de 2014 em diante. A remuneração mínima (que em 2020 abrangia 23,6% dos trabalhadores por conta de outrem) contribuiu para a compressão da estrutura salarial e para a redução da desigualdade salarial, destacam os autores. Entre 2006 e 2020, o rácio entre os 10% de trabalhadores que ganhavam mais e os 10% que ganhavam menos registou uma queda significativa, passando de 4,1 em 2006 para 3,2 em 2020. O crescimento dos salários foi mais expressivo nos grupos em que a prevalência do salário mínimo é maior, nomeadamente os jovens com menos de 25 anos, as mulheres e os trabalhadores com o ensino básico. Já os trabalhadores com salários mais altos tiveram aumentos menos expressivos. “Para além do efeito da retribuição mínima mensal garantida, esta dinâmica salarial reflete o maior crescimento da oferta de emprego com maiores qualificações, num período caracterizado por importantes alterações demográficas e por um aumento expressivo da escolaridade”, concluem os economistas que assinam o tema em destaque do boletim económico do BdP.
c/Público
